Naquele dia o cheiro de borracha nova de bicicleta se incorporava aos secos e molhados do armazém, meu coração nunca mais esqueceu a possibilidade de correr pelas ruas cabelo ao vento e a alegria de ter rodas. À noite o sonho foi embora com o assovio do guarda noturno que permitiu a fuga dos móveis e pertences da família, em busca de refugio no Rio de Janeiro.
Mas antes disso muito se perdeu naquele jardim, meu pequeno Pato Donald, azul no meio da plantação de alecrim que minha mãe usava na carne, o cheiro vinha de longe nos colocar na mesa de refeição. Uniforme escolar e cabelo alinhado, em busca do Caminho Suave que possibilitaria eu escrever mais tarde, apesar das deficiências no aprendizado, por conta daquela gestação equivocada, e mal resolvida para mim, lembranças do dia a dia dos anos em que vivi buscando um lugar para recolocar minha raiz.
No dia seguinte, o aroma da salsicha de lata com batatas amorosamente cozidas pela Tia Luisinha, nos alimentou e fomos embora para sempre, deixando para traz, os sons dos cachorros Rex que tinha convivido conosco na infância, do cantar das galinhas que conviveram naquele quintal por alguns dias, da jabuticabeira redonda e preta que tivemos que dividir com remelenta filha do amigo de meu pai, dos almoços com amigos da policia que me mostrou pela primeira vez uma folha de maconha quando eu tinha cinco para seis anos. Do brilho falso das pedras preciosas que vinham de brinde no sabonete, mas principalmente do cheiro doce e profundo da bicicleta que nunca mais me abandonou.
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